Sexta-feira, 1 de Setembro de 2017
O senhor Júlio e o amigo Costa...

20170901 Júlio Mendes.jpg

 

O dia corria calmo na Mercearia Victória, até o Guito chegar a correr, esbaforido e a tremer, à beira do senhor Júlio. A vontade de agradar era tanta, que o jovem marçano atrapalhava-se todo quando tinha algo para lhe dizer.

- Ó sô Júlio, sô Júlio. Estão a telefonar de Braga a oferecer uma pipa de massa por um patrocínio. Querem pôr um anúncio na mercearia a dizer "Eu só quero ver Guimarães a arder!". É um bom negócio não é, sô Júlio?

O merceeiro nem queria acreditar naquilo que acabara de ouvir. Deitou as mãos à cabeça e disse, suspirando e tentando manter a calma...

- Não, não é um bom negócio... Olha, vai mas é atender o telefone!...

O marçano lá foi atender o telefone, cabisbaixo e desapontado. Estava mesmo convencido que era um excelente negócio. Não passou nem um minuto até o Guito voltar a correr... esbaforido. Agora sim. Agora era um coisa realmente importante.

- Sô Júlio, sô Júlio, venha depressa ao telefone. É aquele senhor do Porto, aquele seu amigo importante.

Já de paciência esgotada, nem ouviu o que o marçano lhe acabara de dizer.

- Ouve lá, ó Guito, já puseste o cartaz da abertura dos saldos, lá fora, como já te disse para fazeres, não sei quantas vezes?

- Sim, quer dizer, ainda não, mas ouça, sô Júlio... é o senhor Costa, o ricaço da fruta...

Quando ouviu aquele nome, o senhor Júlio saltou como uma mola. A velocidade com que voou para o telefone, só encontrava par naquela que tinha trazido o marçano até si. O senhor Júlio era uma daquelas pessoas que se põe logo de pé e em sentido, quando fala com alguém importante, ainda que seja ao telefone. Parecia um Polícia da Régua do tempo da Outra Senhora, a falar com o Chefe da Esquadra.

- Bom dia, senhor Costa. Como passa Voss’elência?

- Ó meu caríssimo e ilustríssimo amigo – o comerciante da fruta falava sempre assim, quando estava na iminência de impingir alguma coisa a alguém - Teinho excelentes notícias para lhe dar...

- A sério, senhor Costa?

- É berdade, amigo Júlio. Excelentes notícias. A primeira é qu’apesar d’afinal já num lh’ir pagar os 3,5 milhões da puonta-d’áuncinho brasileira que lhe comprei no princípio do ano, teinho uma soluçom MUITO melhor. Palabra d’onra! Teinho aqui um material espectacular p’rá sua mercearia. A mim num me serbe p’ra nada, mas a buocê... upa, upa.

- Ó senhor Costa, mas eu já devia ter recebido esse dinheiro no início do ano, e tenho aqui uns clientes que passam a vida a chatear-me por causa das contas da mercearia...

O comerciante do Porto nem o deixou acabar de falar, continuando...

- Ó meu caro amigo, o pribilégio que eu lhe doue de poder fazer crescer as nossas pláuntas berdes qu’eu tão generosamente lh’impresto, p’ra depois lhas ir buscar quando já estiberem no puonto, deberia ser uma contrapartida mais do que justa e suficiente. Mas p’ra buocê ber como eu soue realmente seu amigo, bou máundar-lhe uns monos e uns artigos que tenho p’ráqui fuora de prazo. E tudo isto por apenas esses tais 3,5 milhões. Uolhe, bou máundar-lhe táumbém uns sacos cum azeitona e, se quiser... erbilhas...

Os olhos quase saltavam das órbitas do senhor Júlio...

- O Corona e o Iker Casillas? Ó senhor Costa, isso é que era um grande negócio...

- Amigo Júlio, nós os dois só fazemos gráundes negócios. Mas cumprienda que se fosse o Corona e o Casillas, era um gráunde negócio... mas era p’ra buocê, num era p’ra mim. – respondeu-lhe, não conseguindo evitar soltar uma sonora gargalhada – Se calhar máundo-lhe é um marçáno...

- O Marcano, senhor Costa?

- E buocê a dar-lhe, ó Júlio. O Marcano táumbém nom... Eu disse um MAR-ÇÁ-NO, porque me parece que buocê está a precisar. O rapaz que m’atendeu o telefone, atrapalhou-se todo quáundo soube cum quem estaba a falar. Mas boltáundo à baca fria, eu até estaba a pensar em máundar-lhe táumbém um óleo alimentar, em garrafões, mas buocê ainda ia pensar qu’era o Aboubakar dos Camarões... se calhar é melhor nom. O qu'eu bou máundar-lhe é uma coisa qu’eu seie que buocê quer muito – o Dragom d'Ouro. Buocê já o merece e assim ficamos quites. Bem sei qu’é uma imitaçom barata em PBC, feito na China, mas uolhe que ninguém diz que num é berdadeiro. Bai fazer uma bistaça na sua mercearia. Por falar em China, ó amigo Júlio, buocê tem é de fazer cum'ós gaijos das lojas dos chineses, Cuompre um Mercedolas p'ra si. Um huomem de sucesso como buocê, num pode andar p'raí numa carroça qualquer. E se o chatearem muito... uolhe... sei lá... diga qu'é p’rós gaijos da UEFA quáundo eles fuorem a Guimarães...

 

Miguel Salazar



publicado por Miguel Salazar às 22:58
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Sábado, 9 de Outubro de 2010
Dom Quixote de la Mancha...

No início do século XVII, o castelhano Miguel de Cervantes Saavedra escreveu aquela que é hoje considerada como sendo a sua obra mais emblemática, com o título original de El ingenioso hidalgo don Quixote de la Mancha.

Don Quijote de la Mancha, como se tornou mais célebre, era ainda conhecido pelo Cavaleiro da Triste Figura.

 

O protagonista desta história é Dom Quixote, um pequeno fidalgo castelhano que perdeu a sua sanidade mental depois de ter lido demasiados romances de cavalaria.

A partir de determinada altura, a sua insanidade acabou por o levar a convencer-se de que seria mesmo um dos heróis desses romances épicos de que tanto gostava.

Dom Quixote, tinha como seu fiel amigo e companheiro, Sancho Panza, que é definido por Miguel de Cervantes como sendo um “homem de bem, mas de pouco sal na moleirinha”.

Dom Quixote, sempre acompanhado pelo seu escudeiro, resolveu então partir à aventura, enfrentando inimigos que apenas existiam na sua imaginação perturbada.

Apesar de se tratar de meros moinhos de vento, Dom Quixote conseguia ver em cada um os seus rivais e inimigos, numa enorme e permanente alucinação.

 

Desde então, e até aos dias de hoje, muitas representações já foram feitas a partir da história de Dom Quixote e Sancho Pança.

As mais recentes, em Portugal, tiveram as suas estreias em Guimarães, no estádio Dom Afonso Henriques.

A primeira esteve a cargo de uma companhia de teatro de Lisboa, e teve como principais protagonistas dois artistas muito engraçados – Luís Filipe Vieira e Jorge Jesus.

Neste último fim-de-semana, foi a vez de uma outra companhia (esta do Porto) apresentar nos principais papéis, Jorge Nuno Pinto da Costa e André Villas-Boas, o primeiro já há muito reconhecido como sendo um dos maiores talentos da “stand-up comedy” nacional, e o segundo que surge agora como uma enorme revelação – um verdadeiro talento emergente.

Uma característica comum a estes quatro artistas é o empenho e a dedicação que cada um tem posto nas suas representações. Uma outra, é a predilecção de todos pelo papel de Dom Quixote, o que tem feito com que se tenham revezado na interpretação do Cavaleiro da Triste Figura.

As apresentações das duas companhias de teatro foram de elevadíssima qualidade, o que não tem permitido que haja um verdadeiro consenso sobre qual das duas terá sido a melhor e mais bem conseguida.

Não há consenso sobre a melhor apresentação, nem tão pouco sobre o melhor artista.

Sendo a alucinação e o afastamento da realidade, a principal característica da personagem de Dom Quixote, não é possível apontar qual dos quatro tem sido o melhor actor, dada a excelência do desempenho de cada um.

O problema mais preocupante é que, em todos os casos, os artistas nunca mais conseguiram deixar de representar o papel de Dom Quixote, desde que o mesmo lhes coube em cena.

Aquilo que hoje mais se teme é que a experiência da interiorização da personagem tenha sido tão intensa que, tal como Dom Quixote, já não sejam capazes de distinguir mais aquilo que é a realidade daquilo que é apenas ficção…

 

E depois, no meio de todo este cenário quixotesco, continua impávido e sereno o nosso Manuel Machado que, ignorando os quatro Cavaleiros das Tristes Figuras, lá vai levando a água ao seu moinho...

 

José Rialto

 

post scriptum

Moinho que, sendo o nosso, cada vez assusta mais estes Cavaleiros das Tristes Figuras !

 

(cartoon publicado no Dom Afonso Henriques e no Depois Falamos)

 



publicado por Miguel Salazar às 01:13
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Quarta-feira, 25 de Março de 2009
Sabujice...

 

 

 

(sem legendas)

 

(cartoon publicado no Depois FalamosVitória GrandeSic Gloria Transit Mundi, Assoc Vitória Sempre, Jornal Vitória, O Último Clandestino, VIP França TV Tuga Fórum)

(participei com este cartoon no Prémio Stuart de Desenho de Imprensa, de 2010)



publicado por Miguel Salazar às 02:03
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